A tradução exata deste termo
seria parentalização lenta, mas no brasil há alguns movimentos denominados
“Pais sem pressa”, termo que nos apropriamos aqui no RS para disseminar este
conceito através do blog, de eventos e projetos. O termos Slow Parenting foi
proposto pelo escritor canadense Carl Honoré, surgindo nos Estados Unidos como
uma filosofia contemporânea na educação das crianças. O termo é muito novo, mas
não sei precisar a data exata em que surgiu.
A que exatamente o termo se refere?
Refere-se a consciência ampliada
sobre deixar as crianças explorarem o mundo a sua maneira. Diminuir a
velocidade das exigências com os filhos e deixar espaço par estar presente como
pais. É parar deler e-mails enquanto brinca com os filhos. Parar de apressar as
tarefas de rotina para não chegar atrasado em agendas lotadas de compromissos.
E desta forma, tornar a vida da família mais simplificada. Menos “fast” para
tudo, menos consumo, menos metas, menos comparações, menos buscas desenfreadas
por patologias (rótulos) e soluções médias. Mais pais, menos pressa e mais presença.
Desde quando se tornou popular na Europa e EUA e
quando foi introduzido no Brasil?
Não tenho a informação exata de
quando se tornou popular na Europa e EUA, mas o livro “Sob Pressão”, do Carl
Honoré foi o primeiro a tratar este tema e foi lançado no ano de 2009 em inglês
(Under Pressure). Aqui no Brasil, o primeiro registro popular que temos foi em
novembro do ano passado, em São Paulo, onde aconteceu um evento aberto ao
público e reuniu mais de 1.500 pessoas. Já aqui no RS estaremos promovendo o primeiro
debate com pais em um evento chamado “Conversas do Bem - #PaisSemPressa” que
irá ocorrer no dia 27/10, 19:30 na escola Monteiro Lobato. Temos também o
projeto de lançar um livro sobre o tema no ano que vem, bem como promover o
primeiro encontro aberto ao público em Porto Alegre.
Quais os principais princípios deste conceito?
O conceito original prevê sete
mandamentos. Particularmente gosto deles, mas estamos propondo uma conversa
mais ampla e mais profunda. Não queremos seguir a risca um movimento
internacional e sim entender as necessidades das crianças e dos pais na nossa
cultura. Acima dos mandamentos proposto pelo criador do termo, entendemos que o
movimento Pais sem pressa precisa ser baseado em afeto, permissão e presença.
Não acreditamos em fórmulas de como um filho deva ser educado. Propor algo
nesta linha seria apenas substituir conceitos. Porém alguns princípios seguem
sendo atuais. Pais precisam estar mais presentes, não de forma quantitativa,
mas qualitativamente. Observar, dialogar e escutar ainda não essenciais para
desenvolver um espaço familiar sadio.
Mandamentos Pais Sem Pressa
(adaptado por nós):
-
Sem agenda: sabemos que as crianças possuem
agendas extensas e as vezes as atividades podem estar sendo prazerosas. Mas
alguns questionamentos profundos a serem realizados: é mesmo necessário toda
esta agenda? Meu filho está bem (emocionalmente) com esta agenda? Ela tem a
permissão de não querer mais esta agenda?
-
Mini-executivo: nós adultos sentimos o peso de
agendas sobrecarregadas, imagina uma criança. Além disto, observamos que está
sendo frequente as crianças serem chamadas (e posicionadas) como
mini-executivos, mini-chefes, mini-modelos, entre outros... Criança é criança,
e não “mini-alguma coisa”.
-
Dê ouvidos: escutar o filho é básico para uma
relação de amor e confiança. Mas isto tem confundido os pais a pensarem que
significa deixar os filhos fazerem o que quiserem. Dar ouvidos é gerar
permissão para que as crianças sejam quem querer ser, sem abrir mão de fazer o
que precisa ser feito.
-
Menos, menos: brincar não deveria estar nas
agendas. Brincar é condição do desenvolvimento da criança. A falta deste
espaço, somado a alta carga de cobrança e expectativa, geram ansiedade e
sintomas físicos.
-
Tédio faz bem: mais uma vez, podemos utilizar a própria
experiência como adultos. Todos nós gostamos de momentos de descanso, sem
compromissos e expectativas. As crianças também. São nestes momentos que a
mente se expande a novos e livres pensamentos, desenvolvendo a criatividade e
diminuindo a ansiedade.
-
Ócio familiar: a família toda precisa entrar
neste clima “slow”. Deixar a agenda livre para família faz bem à todos os
membros. Poder estar livre para cozinhar, brincar, conversar, jogar. Mas como
tudo, é preciso cuidar o equilíbrio desta gestão das atividades. Pais sem
pressa não é ócio na educação. Excesso de ócio pode caracterizar pais ausentes
e filhos indisciplinados. O ócio precisa ser cultivado como um valor, porém
como um momento específico. Criança precisa de rotina e limites.
-
Novos amigos: deixar a criança se relacionar com
outras crianças. O círculo social dos filhos precisa ser maior do que apenas o
círculo familiar.
De onde surgiu a necessidade desta desaceleração
das crianças?
Percebemos que primeiro surgiu a
aceleração dos adultos. Gerações de adultos obcecados por carreiras intensas,
com necessidades de crescimento rápido. Com isto, estes pais acabaram
“acelerando” os seus filhos como consequência de suas próprias vidas. Correr
para se vestir, tomar café, arrumar o material, entrar no carro... A
necessidade dos filhos correrem para acompanharem a vida frenética dos pais. Na
sequencia, os mesmos pais começaram a “pressionar” os filhos a serem super
filhos. Precisam ser os melhores na escola, no condomínio, na família. Com o
passar do tempo, este ritmo acelerado trouxe problemas emocionais e perdas
significativas na qualidade de vida dos adultos, que então passaram a buscar
uma forma de desacelerar suas vidas e se preocupar com o que realmente importa.
E os filhos costumam ser consequência das escolhas dos pais. Por isso a
filosofia Pais sem pressa tem crescido. A busca para que os filhos não vivam o
alto grau de estresse que nós adultos temos vividos para cumprir com
expectativas sociais.
Quais os benefícios práticos de deixar a criança
mais tempo no ócio e não estimula-la com diversas atividades?
Antes de mais nada, acredito que
seja interessante esclarecer o que seja este ócio citado nos princípios do Pais
sem pressa. Ócio como uma atividade sem um objetivo específico. Ócio no
conceito já apresentado pelo italiano Domenico de Masi: ócio criativo. Ou seja,
não é a ausência de atividade, ou mais vulgarmente falando, não é a
vagabundagem. Acima de tudo o importante é deixar a criança explorar o seu próprio
mundo, o que lhe interessa e o que lhe desperta atenção. Desenvolver
habilidades por ela própria, de forma livre, sem compromisso. Isto acalma e
amplia a criatividade. Este ócio vai ajuda-la a descobrir suas habilidades sem
que isto seja uma cobrança ou uma expectativa.
Em termos neurológicos, existem malefícios
comprovados desta super estimulação das crianças?
Não tenho nenhuma informação
específica de estudos comprovados. Posso observar as vantagens e desvantagens
deste modelo de educação através dos mais de dez anos de atendimento clínico à
crianças e famílias. O que percebo são famílias culpadas, se sentindo
pressionadas pela própria cultura social e para obter a sensação de proteção do
filho, acabam incluindo as crianças neste modelo acelerado, consumista,
competitivo e “mini-adulto”. Estes anos todos me levaram a confirmar que este
tipo de conduta é um dos fatores que tem ligação direta com questões de
ansiedade, desatenção, desmotivação e dificuldade relacional.
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